quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Cofre de poemas

Aos 95 anos, Daniel Lima publica sua primeira obra, com versos marcados por reflexões filosóficas
Avesso à publicidade, Daniel relutou para deixar publicar o livro Foto: Arquivo Pessoal

É no mínimo curioso que a primeira obra de um escritor seja publicada quando ele já conta 95 anos. Quando se trata de um senhor que não dá entrevistas, esconde a sete chaves seus poemas e busca o anonimato há cerca de 30 anos, desde que se aposentou das salas de aula, o estranhamento é maior ainda. Poemas, de Daniel Lima, editado pela Cepe e lançado hoje, às 19h, na Livraria Cultura, possui esta aura de mistério. Somente alguns poucos amigos tiveram acesso aos versos que compõem o livro, difíceis de classificar por tema, estilo ou forma.

São 416 páginas divididas em quatro livros. Escritos em várias fases da vida, os versos possuem linguagem despojada e presença marcante de reflexões filósoficas, influência dos anos em que atuou como professor da Faculdade de Filosofia de Pernambuco. ´O diretor achava que ele corrompia a juventude`, recorda Luzilá. Mesmo naquela época, o jeito já reservado do professor escondia sua produção. Ele cita nomes como Einstein, Jean-Paul Sartre, Guimarães Rosa, Mário de Andrade, Rimbaud e obras como Hamlet e Dom Quixote, mas não se intimida em criticar os intelectuais, utilizando-se até mesmo de palavrão. De alma barroca, como escreve em um dos poemas, e muito religioso, varia de Deus e personagens bíblicos a descontentamentos e questionamentos internos, passando por homenagem ao Recife e seus rios, tão presente entre os poetas daqui.

Para tornar o livro possível, Luzilá, que é conselheira editorial da Cepe, precisou ´roubar` os originais de 14 livros inéditos, datilografados pela amiga e bibliotecária Célia Veloso. ´Depois de muita insistência, ele deixou publicar, mas depois disse que não tinha deixado. Ele sempre foi estranho. Nunca quis publicar nada`, revela. ´Ele tem muitas obras que eu não tenho conhecimento. Devem estar sendo comidas pelos ratos`. A própria Luzilá confessa que há mais de trinta anos tenta convencê-lo a publicar os poemas, que conheceu um pouco depois do tempo em que era sua aluna de estética na faculdade, quando se tornaram amigos.

´Ele foi o formador de uma geração`, defende Lourival Holanda, professor da Universidade Federal de Pernambuco, que fará palestra hoje no lançamento, ao lado de Zeferino Rocha. A lista de alunos e fãs de Daniel Lima inclui ainda Francisco Brennand, Jomard Muniz de Brito, Zeferino Rocha. Muitos deles conheceram seus versos através de versões pirateadas, feitas a partir de poemas roubados. ´Ele tinha um fã-clube na universidade que era uma coisa`, garante Luzilá.
(Luiza Maia) 

Fonte: Diário de Pernambuco 

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